domingo, 5 de fevereiro de 2012

Análise: A Separação

Vencedor do Urso de Ouro em Berlim no ano passado, ganhador do Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro e favorito ao Oscar nessa mesma categoria, A Separação é um dos filmes de maior hype da temporada. Para efeitos práticos, isso é maravilhoso - não só o filme merece a atenção que está ganhando, como também isso possibilita que os cinemas brasileiros se interessem por exibir um filme iraniano que em outros momentos seria extremamente obscuro. O fato é que A Separação, do diretor Asghar Farhadi (cujo roteiro também recebeu uma indicação ao Oscar), é um dos filmes mais complexos dos últimos tempos, uma obra-prima asiática cujo grande mérito é não se ater a um único elemento, mas explorar diversas vertentes narrativas e obter como resultado um filme de força única.

Nader (Peyman Moaadi) e Simin (Leila Hatami), um casal que está junto há 14 anos, está buscando a separação junto à lei iraniana, pois Simin deseja deixar o país em busca de melhores condições de vida, desejo não compartilhado por Nader. Simin não só se ressente da corte iraniana por recusar constantemente seu pedido de divórcio - os juízes tendem a achar sua justificativa "fraca" -, como também pela passividade do marido de tantos anos em aceitar a separação e pelo fato da filha de 11 anos do casal, Termeh (Sarina Farhadi), estar relutante em acompanhar a mãe em sua partida ao exterior. Nader, contudo, se vê de mãos atadas por causa de seu pai, sofrendo com um estágio avançado de Alzheimer, e não vê outra opção a não ser seguir um caminho diferente de sua esposa. A trama se torna mais complexa quando passa a envolver a vida de outra família. Nader contrata Razieh (Sareh Bayat), uma mulher extremamente humilde, para tomar conta de seu pai, mas ela logo se vê dividida entre a necessidade de sustentar sua família, já que seu marido, o explosivo Houjat (Sharab Hosseini), está cheio de dívidas e com uma ameaça de prisão pairando sobre sua cabeça, e sua fé na religião islâmica, que a impede de tomar conta do pai debilitado de Nader adequadamente. Um incidente, porém, colocará as duas famílias em lados opostos do tribunal, com um problema muito maior do que a separação do título para ser resolvido.

O roteiro de Farhadi é de uma genialidade única. Ele não se prende em maniqueísmos e dualidades: todos os personagens são complexos e falhos, algo que fica exposto quando a trama se adensa e a moral de todos é colocada em questão. A humanidade que o diretor imprime em seus personagens é notável e torna cada passagem do filme extremamente crível. O roteiro também é extremamente detalhista, com ligações intrincadas entre situações diversas, o que acaba criando o clássico "piscou, perdeu". Chama atenção também a fotografia do longa, que evidencia, por meio do uso dos espaços físicos do cenário, a separação do casal principal, que vai se intensificando conforme o filme vai chegando ao seu clímax.

O ponto alto do filme talvez seja seu sucesso em apontar as várias inconstâncias e injustiças da sociedade iraniana e sua lei, notadamente machista e imperfeita, sem usar tons alarmistas e de denúncia. Tudo em A Separação é sutil, assim como sua capacidade de agregar os mais diversos temas e questionamentos sem se sobrecarregar ou perder. Paradoxalmente, quanto mais complexo o filme se torna, mais equilibrado ele fica, de modo que a sensação ao sair do cinema é que ficaram muitas coisas na cabeça para serem pensadas. Muitas, mesmo.

Nota: 5,0 de 5,0.

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