terça-feira, 3 de abril de 2012

Análise: Um Método Perigoso

Eu vou começar essa resenha de forma direta e um tanto quanto bombástica, porque considerando seu teor altamente contraditório, não há outra maneira de fazer isso. Eu já vi alguns filmes de David Cronenberg, não todos, mas uma boa parte, o suficiente para dizer o que vou dizer agora: Um Método Perigoso, seu último filme, que chega ao Brasil com quase um ano de atraso, é o pior de sua filmografia. Não, ele não é nenhum desastre. Pelo contrário, suas características positivas superam as negativas. Seu maior pecado, porém, é ser convencional demais, não ousar, se manter colado demais ao padrão, ainda que seja fruto justamente de um diretor que é famoso por não gostar de chegar nem perto de nada disso. Apesar disso, e contraditoriamente como eu já avisei que essa resenha seria, o filme ainda assim é altamente assistível, e um trabalho de forte atuação.

A trama, baseada em uma mistura de fatos reais e suposições amplamente aceitas pela história, mas com muitos detalhes ainda desconhecidos, narra a amizade de Carl Jung (Michael Fassbender), o pai da psicologia analítica, e Sigmund Freud (Viggo Mortensen), o pai da psicanálise. Jung e Freud tiveram uma relação primeiramente construída sobre uma base de admiração, mas que foi gradualmente se deteriorando em função das divergências entre esses gênios do século XX, tanto no campo das ideias quanto em aspectos mais pessoais. Entremeando essa amizade está o relacionamento de Jung com Sabina Spielrein (Keira Knightley), uma mulher inicialmente diagnosticada como histérica que acaba sob os cuidados do psiquiatra. Jung tratou de Sabina, transformando-a em sua paciente modelo, e estimulou a paciente a seguir o caminho da psiquiatria, fazendo com que ela se tornasse uma das primeiras mulheres a se destacar na área. Contudo, o relacionamento de ambos rapidamente evoluiu para algo mais, apesar de Jung ser casado, o que escandalizou a comunidade científica da época.

Mantendo-se bastante fiéis ao que é conhecido historicamente, nem Cronenberg nem o roteiro de Christopher Hampton procuram correr riscos. Bem diferente disso, o diretor canadense entrega seu trabalho mais "modelo clássico", com roteiro amarradinho (mas com algumas ótimas tiradas e diálogos potentes) e estrutura extremamente convencional. Essa incapacidade de ir além do filme incomodou particularmente pela mistura de um tema promissor com a presença de um cineasta ousado e talentoso, mas não chega a comprometer o filme como um todo. Apenas, porém, faz com que ele não ganhe um ar de "memorável" ou mesmo não perdure por mais tempo na cabeça do espectador. Ao dizer isso, não quero insinuar que o filme deveria obrigatoriamente cair na predileção pelo bizarro e por estéticas perturbadoras de Cronenberg. Ele já provou que pode fazer muito bem enredos mais mundanos, mas ainda assim impactantes com Marcas de Violência e Senhores do Crime. Esses exemplos, porém, mostram sua capacidade de fazer algo mais em argumentos mais pé-no-chão.

Dessa forma, o grande trunfo do longa está em suas atuações. Se Michael Fassbender, um excelente ator, não entrega seu papel mais impressionante, ele ainda cria um Jung crível e interessante. A atuação de Keira Knightley talvez divida opiniões por seu embasamento (na primeira parte do filme) em tiques histéricos e no próprio exagero característico dessa condição, mas eu particularmente gostei. Contudo, quem se destaca é Viggo Mortensen, sem medo de imprimir uma marca pessoal em seu personagem, fazendo um Freud de características próprias. Há ainda uma participação rápida e competente de Vincent Cassel como o psicoanalista e maluco-não-tão-beleza Otto Gross. Como um todo, o filme entretém e chega a seu objetivo, mas não me surpreenderei se daqui há alguns anos ele se transformar em obra renegada pelos fãs extremos de Cronenberg. Para o resto do público, em especial, os fãs de enredos com grandes dilemas psicológicos, a conferida pode valer a pena.

Nota: 3,5 de 5,0.

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